Filosofia do possível

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segunda-feira, 18 de maio de 2015

EVA E A SERPENTE: ONDE TUDO COMEÇOU... - PARTE FINAL

EVA E A SERPENTE: ONDE TUDO COMEÇOU...
PARTE FINAL

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            Como vimos anteriormente, Eva era uma personagem quase figurativa, sempre acompanhando Adão, único papel para que foi criada. Mas, com o veto divino proibindo-os de deglutir o fruto da árvore do conhecimento, ocorreu uma reviravolta radical sobre todo o enredo da trama. Esse revés radical, transfigurou toda a compreensão acerca do mundo Edênico, pois revelou um componente que até então Adão e Eva não tinham ciência. Revelou que aquele lugar que eles acreditavam ser um Paraíso, algo homogêneo, coeso e uniforme, era, na realidade, um mundo dicotômico, ramificado e bipartido. Existiam gradações, escalas, hierarquias e onde existem distinções existem privilégios, vantagens, regalias e algumas exclusividades que discriminam e favorecem pessoas e grupos em detrimento de outros, um mundo que conhecemos muito bem. Logo, tudo um grande engodo programado nas mentes subjugadas de Adão e Eva, verdadeira obra realizada pelo “Criador Divino”, para com isso poder docilizar e escraviza-los a seu bel-prazer.  Eis a verdadeira razão de ser das doutrinas, especialmente, as religiosas, que lobotomizam fundamentalmente seus seguidores para poder subjuga-los e explorá-los sob todos os sentidos, ovelhas passivas de um rebanho de pastores tiranos, ”prestidigitadores”, ambiciosos de poder e riquezas. Verdadeira razão pela qual ser sempre o conhecimento seu principal inimigo, por iluminar as mentes e, com isso, desvendar os verdadeiros interesses por trás dessas “sagradas” alegorias.

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            Com esse novo fato, os autores do Mito do Pecado Original precisavam de um bode expiatório para poder manter a imagem do Criador limpa, imaculada e, para tanto, articularam uma saída para desviar o olhar dos fiéis da constatação que o Paraíso nunca existiu realmente, algo que destruiria todas suas mordomias e privilégios, conquistadas através desse condicionamento induzido nas massas representado no Gênesis bíblico pelos personagens de Adão e Eva, duas cobaias humanas sob a tutela desse “Deus judaico-cristão”.

Para a manutenção da farsa se tornou imperioso a criação de um culpado, de um réu que suportasse toda a carga de pungimento e de expiação, que não alterasse os objetivos visados, capaz de deslocar todas as atenções para ele, fazendo do veto divino um ato de amor e não a comprovação da esquizofrenia humana, justificando integralmente o novo rumo adotado pelos autores da alegoria.

Para isso, é criado um novo conceito, disparatado, incoerente e abstruso, capaz de salvaguardar todas as “verdades divinas” apresentadas. Surge o conceito do livre-arbítrio. Conceito que faz do homem sujeito de seu próprio destino,  ganhando autonomia e independência como se ele estivesse pronto para tal responsabilidade, como se fosse possível para uma criatura ser independente e senhor do seu destino, e toda essa emancipação e liberdade brotando do nada, da mesma forma que surgiu o veto divino do fruto proibido, sem nenhuma lógica, sem nenhuma ligação anterior com o enredo da estória até aquele momento, mais um “milagre divino”, mais um reparo tosco e indelicado para a manipulação das mentes humanas.
Depois de todos esses remendos grosseiros e mal articulados, os autores conseguiram criar um expediente, uma saída, podendo a partir desses elementos, concentrar toda a culpa, principalmente, sob os ombros de Eva, personagem escolhida para ser achincalhada e ridicularizada, desde aquele momento. Aqui o Mito deixa claro seu objetivo de rebaixar o gênero feminino, colocando-o numa posição torpe, indigna e subalterna. Eva ganha o status de protagonista do mal, a grande culpada por tudo o que ocorreu na história da humanidade, responsável pela queda dos seres humanos num mundo dicotomizado e bipartido, mundo onde passamos a viver uma existência com sofrimentos e dissabores.  Nasce a primeira grande vilã, marca que acompanhará o sexo feminino, tipificação responsável por toda essa vitimização do feminino no mundo ocidental pós antiguidade clássica.
O Mito do Pecado Original explicita que o mundo está cindido em dois lados: o bem e o mal. O Bem, lado do Deus judaico-cristão, tem como seu herdeiro único Adão, concebido diretamente do Criador, sua imagem e semelhança. É o caminho que se deve seguir para ser salvo. E subliminarmente, segundo os autores da Alegoria, o gênero masculino por ser descendente direto do Pai Divino, já têm na sua natureza o lado do Bem, sendo por isso um caminho natural, mais fácil de ele atingir a salvação.
Já Eva, primeira representante do gênero feminino, por ter nascido de Adão e não diretamente do Criador divino, não tem essa mesma ligação com Deus, o que faz com que leve uma certa desvantagem em relação a Adão. Por isso, Eva será a primeira a desobedecer às ordens divinas, eis a mensagem legada pelo Mito. Isso, naturalmente, fez com que se olhasse o gênero feminino como um ser ínfero, resultando na maneira como a mulher passou a ser tratada na sociedade ocidental sob o domínio da religião judia e cristã.

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Além disso, mesmo sabendo da proibição, Eva preferiu escutar a Serpente da árvore, mordendo a maça proibida. Dessa forma, se Adão era discípulo do Criador, ao obedecer a Serpente, Eva se transformava em discípula da Serpente, uma das figuras representativas com que se simboliza o demônio, do lado do mal, reiterando a ideia de atrelar o gênero feminino ao mal, ao pecado e a imoralidade.

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Mas, como nada é perfeito, se observarmos essa estória de maneira mais imparcial, é possível verificar que enquanto o Deus monoteísta judaico-cristão é o mestre de Adão, do gênero masculino, esse ditador tirânico e cruel, que subjuga e distorce a realidade quando quer e bem entende, transformando Adão num fiel inconsciente e cego seguidor de suas ordens. Eva, tem como mestre a Serpente da Árvore do Conhecimento, que nada impõe, mas antes instrui e convence, fazendo com que aquele que atinge o conhecimento possa ser soberano e responsável por suas escolhas, por suas verdades e construtor de seu destino, podendo ver a realidade com outros olhos e sob outro ângulo que não o imposto pelo manipulador. Logo, quem nos liberta do jugo violento e opressor à que estávamos confinados será Eva que, ao nos fazer morder o fruto proibido, nos tirará do êxtase esquizofrênico e letárgico em que estávamos presos, nos fazendo “cair” na realidade. É ela que, após atingir o conhecimento, reconhecendo a verdadeira situação que estava submetida, auxilia Adão a perceber a realidade a que estava subjugado, gerando a possibilidade de Adão se libertar do jugo “divino”.

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Eva será a primeira a atingir o conhecimento, recuperando sua consciência acerca de sua real situação naquele momento. Eis a principal razão de tanta ojeriza e rancor contra o gênero feminino, responsável pelo início de toda a vitimização feminina que estamos abordando nessa série de postagens.
Na próxima postagem, mostraremos através do conto “Branca de Neve e os Sete Anões”, em sua versão mais conhecida, o desenho de Walt Disney, como esse rebaixamento a uma personificação de segunda categoria é desenvolvida através dessa fábula tão popular, ingênua e pueril, exigindo todo um enquadramento do gênero feminino, iniciado, como vimos, no Mito do Pecado Original.

           

Até a próxima!

FERNANDO MANARIM
             
           
           


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